UnB e UFMG realizaram montagem dos 17 laboratórios da nova Comandante Ferraz. Cerimônia de abertura acontece na terça-feira (14)
Nova estação antártica tem área aproximada de 4.500 m² e resiste a ventos de até 200 km/h. Foto: Paulo Câmara/Arquivo Pessoal
O Brasil inaugura, na quarta-feira (15), a nova Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF). A base é apontada por cientistas como uma das mais modernas do continente gelado. A Universidade de Brasília e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) são as duas únicas instituições de pesquisa presentes no local desde novembro, com a missão de montar os novos 17 laboratórios e deixá-los operacionais para a inauguração.
“É um grande privilégio estar aqui nesse momento e uma honra representar a UnB. A maior parte da pesquisa brasileira é protagonizada pela força das universidades públicas, e a nova estação tem exatamente essa finalidade de favorecer a pesquisa científica”, conta o professor Paulo Câmara, do Instituto de Ciências Biológicas (IB) da UnB.
Segundo o pesquisador, os laboratórios foram planejados pelo Programa Antártico Brasileiro (Proantar) a partir das demandas identificadas juntos aos cientistas que atuam no programa. Ele garante que “a qualidade dos novos laboratórios não se compara com o que tínhamos até então. Estamos equipados com tecnologia de ponta”.
É o caso do Laboratório de Biologia Molecular, que será de grande valia para a pesquisa protagonizada pela UnB. “Nele poderemos extrair DNA das plantas e amplificar regiões de genoma do DNA. Antigamente essa parte precisava ser feita no Brasil, mas parte do material se degradava durante o transporte. Agora podemos levar o DNA estabilizado e isso é um grande ganho para nós”, destaca o docente da UnB.
>>Confira dossiê sobre a Pesquisa Brasileira na Antártica, na edição n°19 da revista Darcy
INSTALAÇÕES – Com design moderno e tecnologia de ponta, a nova estação possui área aproximada de 4.500 m² e comporta 64 pessoas. Suas estruturas foram projetadas para resistir a ventos de até 200 km/h e aos efeitos de eventuais abalos sísmicos e ciclos de congelamento e descongelamento do solo antártico.
Luiz Henrique Rosa e Paulo Câmara no Laboratório de Biologia Molecular da nova EACF. Foto: Paulo Câmara/Arquivo Pessoal
Um grande salto refere-se a estrutura destinada à pesquisa, saindo de quatro para 17 laboratórios – sendo 14 internos e três externos. O prédio principal está dividido em três grandes blocos.
No Bloco Leste estão, entre outros, laboratórios, refeitórios, cozinha e setor de saúde. O Bloco Oeste dispõe de camarotes (dormitórios), biblioteca, sala de áudio/vídeo e paióis para armazenar mantimentos e água. O Bloco Técnico tem estação de tratamento de água e esgoto, praça de máquinas, geradores, sistema de aquecimento de água, setor de tratamento e incinerador de lixo e paióis diversos.
Devido às severas condições climáticas na região, a obra foi realizada apenas no período de verão antártico, levando três anos para ser concluída. A demanda por uma nova estação surgiu após incêndio em 2012, que destruiu 70% das instalações antigas e causou a morte de dois militares. Desde então, a base brasileira funcionava em estruturas provisórias.
UnB NA ANTÁRTICA – Desde 2013, a UnB se faz presente nas pesquisas da região com o projeto Evolução e dispersão de espécies antárticas bipolares de briófitas e liquens. O estudo é sobre a flora predominante na região, composta por musgos. Desde o início do projeto, já foram coletadas cerca de cinco mil amostras de briófitas. Isso torna o acervo da UnB o maior desse grupo biológico austral no Brasil.
“Muitas das plantas que coletamos ainda não foram estudadas e é fundamental conhecer a real identidade dessas espécies. Elas estão isoladas há muito tempo. Por serem capazes de sobreviver ao frio e aos altos índices solares, concentram alto potencial para pesquisas em diversas áreas”, explicou a doutora em Botânica pela UnB e integrante do projeto Júlia Viegas, à revista Darcy. Descobertas de novas propriedades médicas e farmacológicas são um dos potenciais da pesquisa.
Paulo Câmara alerta que o estudo apenas começa na Antártica, sendo continuado, depois, nas universidades. “Isso reforça a importância de garantir investimento para bolsistas de pós-graduação e demais pesquisadores para que consigam dar continuidade à investigação ao retornarem das expedições”.
O docente comemora os avanços na estação, que “garantirão mais qualidade e segurança na pesquisa”.
Professor da UFMG, Luiz Henrique Rosa estuda fungos antárticos há cerca de 15 anos e coordena, desde 2014, o Estudo da biodiversidade e prospecção de fungos da Antártica – projeto MycoAntar.
Nos últimos anos, Rosa e Câmara intensificaram as parcerias científicas entre UnB e UFMG, a exemplo de experimentos que monitoram a vegetação antártica. Desta vez, os pesquisadores tiveram a oportunidade de atuar juntos na montagem dos novos laboratórios.
“Trabalhei na antiga estação entre 2006 e 2010. Os laboratórios eram externos e, a depender das condições climáticas, a gente não podia se deslocar até eles. Já a nova estação concentra 14 laboratórios internos, sendo que estão mais bem equipados e mais adequados para a linhas de pesquisa do Proantar”, relata Luiz Henrique Rosa.
Rosa acrescenta que a nova estação impacta menos o meio-ambiente e tem estrutura confortável. “Os trabalhos de campo aqui são intensos. Às vezes ficamos expostos a muito frio e vento, em jornadas de até dez horas. É um trabalho extenuante. Conforto térmico e alojamento adequado são importantes para recuperarmos a energia e para favorecer a pesquisa de alta qualidade”.
BRASIL NA ANTÁRTICA – O Programa Antártico Brasileiro realiza uma média anual de 20 projetos de pesquisas nas áreas de oceanografia, biologia, glaciologia, mudanças climáticas, meteorologia e arquitetura.
O Programa existe desde 1983 e, no ano seguinte à sua criação, houve a implantação da Estação Antártica Comandante Ferraz. As instalações brasileiras concentram-se no arquipélago Shetland do Sul, porção mais ao norte do território antártico, separada da parte continental pelo Estreito de Bransfield, e conhecida como Antártica Marítima – com condições climáticas mais amenas do que na parte continental, possibilitando a ocorrência das plantas estudadas pelo projeto da UnB.
A relevância da pesquisa polar para a ciência mundial pode ser facilmente explicada: a Antártica é o principal regulador térmico do planeta e controlador das circulações atmosféricas e oceânicas, influenciando o clima e as condições de vida. Além disso, esta porção do globo detém 70% da água doce e supõe-se que seja uma reserva abundante de recursos minerais, como gás natural.
Para conhecer mais sobre o continente gelado, acesse a Exposição Antártica no Museu Virtual de Ciência e Tecnologia da Universidade de Brasília. O trabalho resulta de expedição científica empreendida por pesquisadores do Laboratório Ábaco da Faculdade de Educação da UnB. A missão incluiu a produção do livro A incrível Viagem do Tio Max à Antártica, disponível para download gratuito.
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